Inflação, recessão e taxas de juro: as perspetivas para os próximos tempos

Ana Carrisso | Fidelity

Diretora associada de Vendas, Fidelity International
Licenciada em Comércio e Administração de Empresas pela LCCI, Ana Carrisso integrou a equipa da Fidelity International Iberia em 1998, onde desenvolveu toda a sua carreira no setor da gestão de ativos.

Setembro de 2024 por Ana Carrisso

O verão chegou ao fim e, embora os EUA tenham assustado os investidores no início de agosto com dados sobre o emprego piores do que o esperado, continuamos a pensar que os atuais riscos de crescimento e inflação se mantêm mais equilibrados. Assim, mantemos a aterragem suave como o nosso cenário base, embora lhe atribuamos agora uma probabilidade ainda mais elevada, tendo passado de 40% para 55% na nossa última revisão do contexto macroeconómico.Também atribuímos uma probabilidade de 30% de recessão, uma vez que acreditamos que a economia norte-americana está a caminhar para um cenário de abrandamento do crescimento e de algum alívio nas pressões inflacionistas. Em suma, embora o risco de recessão tenha aumentado, não atingiu níveis que nos deixam desconfortáveis, sobretudo porque acreditamos que as finanças dos consumidores e empresas permanecem saudáveis. 

Inflação – o que vai acontecer?

Em termos globais, esperamos que o crescimento das grandes economias mundiais se estabilize ou caia ligeiramente abaixo da tendência. Esperamos também que a inflação continue a convergir para o objetivo de 2%, ou próximo disso, que os bancos centrais pretendem alcançar. Esta previsão dá-nos confiança para manter uma postura menos cautelosa em relação à duração. Obviamente, a trajetória da inflação continuará a ser um tema fundamental para nós. A nossa perceção é que continuará a ser persistente – ou “sticky”, como afirmam os anglo-saxónicos –, mas não subirá, e muito menos regressará aos níveis de 2022. Na nossa opinião, a tendência descendente da inflação que observamos durante grande parte de 2023 parece ter estagnado em 2024. Possivelmente, a parte difícil deste processo de ajuste dos bancos centrais será a reta final de regresso ao objetivo de cerca de 2%.

O que esperar da Fed?

Entretanto, o ciclo de cortes de taxas já começou, embora não de maneira uniforme. O Banco Central Europeu (BCE), o Banco de Inglaterra (BoE) e o Banco do Japão (BoJ), entre outras autoridades monetárias de todo o mundo, já iniciaram os seus respetivos ciclos de reduções de taxas de juro. É, portanto, obrigatório monitorizar o impacto da inversão das suas políticas na trajetória da inflação, ao mesmo tempo que aguardamos para ver quais serão os próximos passos. No momento em que escrevo estas linhas, a Reserva Federal é o único grande banco central que ainda não iniciou o seu próprio processo de redução. No entanto, o consenso do mercado considera que a contagem decrescente já começou, tanto devido aos fracos dados sobre o emprego publicados em setembro como devido às explícitas palavras pronunciadas por Jerome Powell no simpósio económico celebrado em agosto em Jackson Hole: “Chegou o momento de ajustar a política monetária”.Embora Powell tenha afirmado que a Fed manterá a sua postura cautelosa, dependendo da publicação de dados macroeconómicos, da evolução das perspetivas e do equilíbrio dos riscos, afirmou também, para não deixar dúvidas, que a “direção a seguir é clara”. Na Fidelity, a nossa equipa macroeconómica acredita agora que é provável que a Fed corte as taxas de juro em 25 pontos base, respetivamente, nas reuniões de setembro e dezembro.

Mas ainda pode haver surpresas...

Dito isto, é aconselhável preparar-se para outros cenários; como ainda é impossível conhecer em toda a sua dimensão os riscos que emanam atualmente dos mercados financeiros, e tendo em conta que ainda pode haver surpresas – nomeadamente com as eleições presidenciais dos EUA em novembro –, não podemos, nesta fase, excluir a possibilidade de cortes mais frequentes e maiores (até 50 pontos base), caso as condições financeiras se tornem mais restritivas.Neste contexto, continuamos a preferir os TIPS norte-americanos (obrigações indexadas à inflação) em detrimento das obrigações do Tesouro dos EUA. Mantemos a nossa subponderação em dívida pública, preferindo antes manter posições em crédito de curto prazo.